Observatório dos Casais de Mestre Sala e Porta Bandeira Entrevista: Squel Jorgea

Por Vitória de Moraes

Carioca da gema, nascida num bairro tradicional da região central do Rio de Janeiro e filha de dois sambistas. O pai, ligado ao Acadêmicos do Grande Rio, a mãe, a Estação Primeira de Mangueira. O avô materno era ninguém menos que um lendário baluarte da Estação Primeira de Mangueira: Olivério Ferreira, mais conhecido como Xangô da Mangueira.

Squel no Ensaio Técnico da Portela em 2024 - Foto: Rafael Catarcione

O samba já estava nas veias. E por influência do pai sambista, logo criou raízes com a tricolor de Caxias, começando a desfilar aos nove anos como baianinha, depois como passista e depois, finalmente como Porta Bandeira Mirim. Em 1999, estreou como segunda Porta Bandeira após vencer um concurso promovido pela agremiação, permanecendo no posto até 2001, quando foi convidada para ser Primeira Porta Bandeira no ano de 2002 onde permaneceu até o carnaval de 2012.


O nome dela é Squel Jorgea Ferreira. Uma divindade. Inspiração para muitas meninas. Inclusive para quem escreve essa introdução, desde quando ainda existiam os Ensaios Técnicos em dezembro de 2015 até nosso primeiro contato, cerca de um mês após aparecer "careca" no desfile campeão da verde e rosa, tornando-se a imagem daquele carnaval.

O Observatório dos Casais apresenta: Squel Jorgea - A Primeira Porta Bandeira da Portela

Observatório: Seu nome é extremamente diferente, quem escolheu seu nome e qual significado? 

Squel: Isso é coisa de pai, né? Pai quem faz essas coisas. Meu pai quem inventou essa moda da Squel Jorgea, porque meu nome é composto. Meu pai quando criança viu um filme infantil que tinha essa personagem e marcou ele e ele disse que quando tivesse uma filha, ela terá esse nome e aqui estou, 41 anos com este nome. Nem eu nem minhas xarás sabemos o significado (sou eu e mais quatro), única coisa que sabemos é que nosso nome vem de um desenho infantil. 

Observatório: Você passou uma vida no Acadêmicos do Grande Rio, como surgiu a decisão de sair da escola?

Squel Jorgea: A minha mãe me criou, apesar das circunstâncias, de uma maneira muito livre, para que pudesse tomar decisões, se não me sentisse mais pertencente à aquele lugar, se esse local não me cabe mais, se não está bom para mim, prefiro sair e aprendi também com ela, que o incomodado que se mude, se não estava feliz, se as coisas não estavam mais me satisfazendo, se não era mais ali que queria estar, por estar tendo problemas com o meu antigo par e então resolvi sair. Minha decisão de sair da Grande Rio começou de 2010 para 2011, porém como houve o incêndio no barracão, como iria sair da escola? Então persisti, segurei por mais um ano na escola e após o carnaval de 2012, fui na diretoria, expliquei meus motivos e pedi para que aceitassem a minha demissão, depois de quatro pedidos, aceitaram. Quando eu decidi sair da Grande Rio não tinha pretensão de ir para outra escola, não tive convite de outra escola, assim como sempre foi na minha vida, sai, sem saber o que ia acontecer.


Para o carnaval de 2013, depois de uma vida inteira numa mesma agremiação, foi para a Mocidade Independente de Padre Miguel, dançar com Feliciano Júnior, a parceria com a escola e com o Mestre Sala durou somente um ano.


Observatório: Como surgiu o convite para dançar na Mocidade?

Squel: Eu estava fora da Grande Rio, a Mocidade passou por mudanças e entraram em contato comigo, assim como outra escola também havia entrado e então preferi ir pra Mocidade pela minha admiração pela escola, é uma escola que fui muito feliz nos 8 meses que vivi lá, fiz amigos, é uma escola que me ensinou muita coisa, principalmente como uma Porta Bandeira deve ser tratada. Tenho muito carinho por eles por tudo que eles me ofertaram.

Último ano de Squel no Acadêmicos do Grande Rio - Foto: Thiago Maia | RioTur

Para o carnaval de 2014, recebeu o convite de ser Primeira Porta Bandeira da Estação Primeira de Mangueira, onde sua família materna tem estreitos laços. Dançou 3 anos com o Mestre Sala Raphael Rodrigues, onde em 2016 foram campeões com enredo "Maria Bethânia - A Menina dos Olhos de Oyá" e recebendo notas máximas no quesito e Squel sendo a imagem do carnaval por ser a 1ª Porta Bandeira a desfilar careca.

Observatório: Como foi o convite para dançar na Mangueira pela sua família materna ser toda ligada a escola?

Squel: O convite para dançar na Mangueira foi do nada, os oito meses que dancei na Mocidade foram muito intensos e graças a criação que a minha mãe me deu, sou muito observadora e além de ser muito observadora, sou pé no chão, é muito difícil me deslumbrar com alguma coisa, ficar cega ao ponto de não enxergar com o que estava acontecendo, percebi o que estava acontecendo na Mocidade e pedi para sair, eu sai de lá de boa, lá fiz amigos e foi uma boa escola. 
Após o carnaval, se não me engano o carnaval caiu em fevereiro naquele ano, fiquei sem escola novamente e algumas escolas iriam passar por grandes mudanças, Mangueira e Portela iam passar por essas mudanças, quando houve essa grande mudança de casais de Porta Bandeira e Mestre Sala fui surpreendida pelo convite da Mangueira, porque antes do convite. Eu achava que ia vestir uma cor só e quando fui ver, a opção mais distante e impossível, que era a Mangueira, que me convidou. Recebi uma ligação da Selminha Sorriso, sou MUITO grata por isso, por ela ter intercedido, por ela ter falado com Chiquinho (candidato à presidência da Mangueira na época do convite) sobre o meu trabalho.
Ela perguntou ao Chiquinho se ele tinha algum nome de Porta Bandeira e ele perguntou a ela se tinha algum nome para dizer a ele, que vindo dela que é uma profissional da área era importante uma profissional indicar a outra. Ela conversa com Chiquinho, ele pergunta algumas coisas e ela responde e ele diz que já haviam falado sobre eu na escola mas questões técnicas e profissionais dela é importante. Então sou muito grata a Selminha.

No dia seguinte da eleição da Mangueira se não me engano ou no mesmo dia da eleição, mas no final do dia, Selminha me liga e pergunta se estava preparada para ser Primeira Porta Bandeira da Mangueira e eu respondi um "oi?", e disse que estava me ligando porque o presidente iria me ligar em seguida e nesses segundos que antecederam a ligação do Chiquinho, eu comecei a gritar, minha mãe e meu irmão foram ao quarto para ver o que estava acontecendo, respondi que era Porta Bandeira da Mangueira.

Squel Jorgea no Carnaval campeão de 2016 - Foto: Thomaz Silva | Agência Brasil

Observatório: Você foi a imagem do carnaval de 2016, qual a importância deste desfile na sua carreira?

Squel Jorgea: Pra mim foi uma novidade esse negócio de ser a imagem do carnaval, me surpreendeu e surpreendeu muito essa fantasia e essa imagem o carnavalesco da Mangueira falava que não tem como uma pessoa passar no carnaval e não olhar prad Porta Bandeira da Mangueira e era um imagem que passava um recado muito importante, contra a intolerância religiosa que vivemos, pois é muito atual ainda, é uma mulher Preta, catulada, vestida de Yawo, segurando o pavilhão da Estação Primeira de Mangueira, uma imagem política, que dá recados. Quando eu vi essa imagem chegando a pessoas no mundo todo, eu sendo marcada e amigos falando que artistas de vários locais estavam me marcando, quando fui perceber a dimensão e entendi o poder do carnaval, o poder da cultura das escolas de samba que nos estamos. Pra mim, isso surpreendeu e é bom perceber que o carnaval ultrapassa barreiras e foi muito importante fazer parte de um momento que o carnaval ultrapassou barreiras e atingiu pessoas que não imaginava, isso é muito bacana, o poder que uma escola de samba tem, me dá um orgulho danado quando a gente ultrapassa barreiras, faz que algo seja conhecido pro mundo e expandiu, por ter sido um instrumento. 

O carnaval de 2017 foi especial, após o seu antigo parceiro, Raphael Rodrigues anunciar que não iria renovar com a escola e que iria seguir novos ares, o seu tio, Matheus Olivério foi convidado para ser seu par, o que gerou uma grande comoção na família e na escola, já que Matheus é cria da Verde e Rosa e nos anos anteriores já era segundo Mestre Sala da Verde e Rosa. O casal dançou junto até o ano 2022, sendo campeões em em 2016 com Maria Bethânia: A Menina dos olhos de Oyá e 2019 com o enredo "História pra Ninar Gente Grande".

Após a Estação Primeira de Mangueira anunciar a renovação do 1º Casal para o carnaval de 2023, chocou a todos anunciando a aposentadoria. Após um carnaval afastada da função de Primeira Porta Bandeira de uma Escola de Samba, Squel aceitou o convite da Portela. Squel foi convidada para fazer par com Marlon Lamar, que está na Portela desde o carnaval de 2018 como primeiro Mestre Sala. 

Observatório: Como foi o convite de voltar a dançar?

Squel Jorgea: O Luiz Escafura (Vice Presidente da Portela) me ligou, anteriormente uma outra escola já havia entrado em contato, só que a Portela balançou pela minha ligação com a escola, tenho amigos na escola, a Tia Dodô, em inúmeras vezes em que estivemos juntas, em que a levei em casa, um dos dias que estive na casa dela, ela virou pra mim e disse: Quem é a sua madrinha no carnaval? Nunca escutei você falando de madrinha e respondi eu não tenho tia Dodô e naquele dia ela me apadrinhou. Tia Dodô não havia o costume de sair de sua rotina e num dos ensaios de Terça Feira do Acadêmicos do Grande Rio, foi me abençoar e então, eu tenho esse elo com a Tia Dodô, tudo que vivi com alguns amigos na escola, momentos importantes, como o falecimento do meu avô (seu Xangô da Mangueira) eu estava na quadra da Portela, quando ele iniciou a trajetória no carnaval, foi Paulo da Portela (fundador da escola) que o apresentou à Cartola e ele segue com Cartola. Acho que a vida me levou a isso. Quando aceitei o convite, não tinha noção do que estava acontecendo, só aceitei porque na minha cabeça era: Vou conseguir voltar, vou conseguir redesenhar a minha história e mostrar ao meu filho a mulher que sou. Sabia que iria enfrentar muita coisa, mas conseguiria voltar pelo meu filho, por mim e ali não havia pensado em nada.

Havia chego pra desfilar pela Unidos do Viradouro e saiu a notícia e assim que saiu a notícia, não me recordo se foi Marcelinho ou Marcelão (então Presidente e Presidente de Honra da Unidos do Viradouro) me disse: você tem noção do que acabou de fazer? É como jogar no Vasco e Flamengo e isso é pra poucas, ninguém nunca fez isso. Na minha cabeça nada disso havia passado, havia pensado só em voltar por mim e pelo meu filho 

Eu ouvi grandes barbaridades, como gente dizendo que fiquei um ano congelada para divulgar minha contratação e achei melhor ignorar e avisei a todos os meus amigos que também ignorassem essas informações. Não  tirei o local de ninguém, aceitei o convite por ser profissional e assim como é no carnaval e no mundo.

Squel Jorgea e Marlon Lamar - Foto: Nobres Casais

Observatório: Você é uma Porta Bandeira que segue a dança tradicional a risca ou aceita influência de outras danças na sua dança? 

Squel Jorgea: Eu dentro da minha crença e dentro do que acredito ser uma Porta Bandeira, não mudei meu estilo, entendi que precisava colocar algumas coisas mas eu não mudei meu estilo. Sou uma Porta Bandeira que desde que comecei, sempre tive um coreógrafo, meu primeiro Coreógrafo foi seu Geraldo Cavalcante, amigo de Joãosinho Trinta que foi indicado pelo próprio para trabalhar conosco, então sempre tive esse terceiro olhar, já havia feito Jazz, então as técnicas e os conhecimentos que tenho e que venho buscando conhecer porque pra mim enquanto artista e profissional, quanto mais conhecimento eu tenho, melhor. Me considero uma Porta Bandeira tradicional e eu, Squel, não me sinto confortável de fazer muita coreografia, pois me sinto distante do que Delegado e Delegado fizeram e a todo momento olho pra mim, pro cenário da dança e olho pra trás e me pergunto se estou muito distante, eu não me via muito distante na coreografia de 2024. Eu quero sempre ser a Porta Bandeira que é ligado ao tradicional. Eu prefiro dançar de forma tradicional, sem muito passo marcado, não tenho nada contra quem faça, mas eu, Squel, prefiro seguir a linha mais tradicional, é a linha que mantém em mim a chama viva em ser Porta Bandeira. 

Renovação

O G.R.E.S Portela anunciou no dia 17 de abril a renovação de Marlon Lamar e Squel Jorgea para 2025. No próximo ano teremos a sorte de ver Squel na avenida novamente como Primeira Porta Bandeira da primeira escola de samba centenária do Brasil no Sambódromo da Marquês de Sapucaí.

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